(Penúltimo capítulo)
A luz que estava bem longe no céu passou a ser a única coisa
que via, os olhos ardiam-me mas no entanto não conseguia fechá-los. Era o
contrário de quando tinha despertado, agora sentia toda a energia comprimida no
corpo que não se mexia, poderia implodir a qualquer momento. A luz
transformou-se em agonia, comecei a ver o meu pai a evitar-me quando lhe pedia
por atenção, enquanto criança. Revivi todas as desilusões numa só. Quando se
esqueceram todos dos meus anos, quando tive que abandonar os meus sonhos, todas
as rejeições, todos os falhanços. Vi-me ferido, não conseguia olhar para a
minha pele, mas teria que estar certamente com queimaduras irreversíveis. Uma
multidão passava ao meu lado e ninguém reagia. Alguém olhou para mim, mas
seguiu o seu caminho fazendo questão de comprovar que me notava mas com total
indiferença. Caía imparavelmente num gigante bolso sem fundo, não tinha nada a
que me agarrar, ninguém para me amparar. Estava agora no meu carro com os
mínimos ligados, só via estrada… os quilómetros seguiam-se e não havia
indicação, não havia sinal de nada nem ninguém, não havia esperança, muito
menos fé. A chorar, gritava por socorro mas os sons saíam mudos. Os meus dentes
embatiam uns nos outros descontroladamente, tinha-me tornado num iceberg prestes a desabar. Só queria
fechar os olhos, tudo o que queria era cerrar o cérebro e reabri-lo bem longe
dali, com a sequela a ser o esquecimento de tudo o que tinha visto.
Senti a visão a afogar-se nas lágrimas, e foi quando elas caíram violentamente pela
face abaixo. Piscando os olhos compulsivamente, limpo-os com as mangas da
camisola, e a vista embaciada desaparece. Estava no mesmo local, mas já não
havia luz no céu. Era um tecto que parecia sofrer uma metamorfose de cores. As
cores do arco-íris substituíam rapidamente o anterior preto brilhante. A terra
estava agora castanha, e podia ainda ver árvores enormes que cresciam
impossivelmente depressa. O homem de bigode espreitou para ver como estava, com
ar preocupado e nervoso, como se o futuro dele dependesse disso. O homem cor de
chocolate coloca-lhe a mão no ombro e oferece-lhe um sorriso amigável e
reconfortante. O homem de olhar felino anuiu para os restantes e desapareceu. A
mulher bocejou, espreguiçou-se e virou-se para o homem de pele dourada:
“Ok, a festa acabou, vamos fechar a tenda.”
O homem de pele dourada olhou mais uma vez no homem de bigode, e com a
concordância do mesmo distribuíram uma enorme quantidade de terra sobre mim.
“AHHHHH!! NÃÃÃ…!!” , nada mais pude acrescentar.
(To be continued)
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