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"Matei-o" - Teatro

O resultado da junção de 9 monólogos da obra "crimes exemplares" de Max Aub foi este, com confissões peculiares de personagens que no fundo... só queriam sossego, coitadas... https://www.facebook.com/antonysousa10/videos/vb.100000047167396/1201844059827155/?type=2&theater

O despertar do fiel lutador

(...)

Cinco figuras dirigiam-se na minha direcção, todos num estilo muito próprio. Uma era mulher, destacava-se pelos olhos alaranjados como o pôr-do-sol, forma elegante como andava, ar confiante. Olhava para os restantes com autoridade, parecendo ter o respeito de todos. Foi a primeira a abordar-me directamente.

“Ora então já venceste a preguiça… não é um mau começo.”
“Onde estou?! Isto… o que é que se passa aqui?!”
“Então! Está com medo o menino? Aqui estás a jogar fora.”, disse com desdém outro dos cinco estranhos. Era um homem, magro, olhar felino, como se me pudesse caçar, mas tinha acabado de tomar a sesta e deixava isso para mais logo.
“Calma. É normal que não perceba o que se passa.”, disse serenamente uma terceira figura. Um homem que se destacava pela sua pele dourada, era alto e encorpado.
“Quem são vocês?!”, perguntei , com pouca crença numa resposta concreta.
“Não me reconheces?”, perguntou com ligeira desilusão um quarto homem. Este possuía um bigode impressionante, estava ansioso, ao mínimo som distante sobressaltava-se.
“E a mim reconheces?”, perguntou o quinto do grupo, com evidente inocência. Tinha pele cor de chocolate, era bastante baixo e aparentava ser o mais novo.
“Não sejam parvos, é óbvio que não vos reconhece!”,  disse convicta a mulher.
“É por coisas destas que sempre disse que devia ser cada um por si. Misturar todos dá nisto. Tenho que ouvir estas burrices. Quer dizer burrices não, que os burros têm a fama mas até que têm um lado parecido connosco… não querem saber do que dizem deles.”, disse o homem de olhar felino.
O riso estridente que tinha escutado no início era agora repetido na íntegra. Entrava nos ouvidos e batia nas paredes do crânio por uns segundos.
“Admites que vocês são um bocado burros?!”, desafiou divertido o homem de bigode imponente. O homem cor de chocolate gargalhava.
“Aqui vamos nós…”, disse para si mesmo o homem de pele dourada cobrindo o rosto com a mão esquerda.
“Acabou! Foi assim que ficou combinado e é assim que vai ser feito. E vamos despachar isto porque já estou a pé há horas, a minha beleza não se pode gastar desta forma gratuita.”, lembrou a mulher com alguma impaciência.
Por esta altura os meus pensamentos estavam estáticos, nenhuma das minhas questões havia sido respondida, e sentia-me perdido no meio da floresta de informação que estes seres aparentavam ter sobre a minha presença naquele local sinistro.
“Eu vou mas é embora daqui!”, pensei por fim.
Antes de deslocar um músculo que fosse, a voz do homem de bigode antecipou-se.
“Não acho que possas encontrar saída nenhuma aqui, desculpa.”, disse, estranhamente tremendo um pouco a voz, com receio, baixando o olhar até à terra que pisávamos.
“Não mostres medo a esse gajo pá! Tenho que te ensinar tudo? Se lhes baixas a cabeça eles fazem o que querem dela! Ele aqui já não é tão campeão… pois não Marco?”, interveio o homem de olhar felino.
Agora era inegável, não estava diante deles por engano, e cada um sabia bem o que iria acontecer a seguir. Não compreendia o que pretendia dizer com aquela última frase, mas sem dúvida que ali, não me sentia nem em casa nem campeão de coisa alguma.
“Serei sempre fiel.”, disse o homem de bigode.
O homem de pele dourada ajudado pelo de cor de chocolate pegaram-me um em cada braço, e levaram-me para o interior do bosque, atrás dos restantes três elementos. Não o faziam de forma bruta, eram firmes mas certificando-se de que não me magoavam.
“O que queres dizer com seres sempre fiel?”
A resposta deu-ma com o olhar, mas codificada por algo que ainda fugia do meu alcance.



(to be continued)

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