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"Matei-o" - Teatro

O resultado da junção de 9 monólogos da obra "crimes exemplares" de Max Aub foi este, com confissões peculiares de personagens que no fundo... só queriam sossego, coitadas... https://www.facebook.com/antonysousa10/videos/vb.100000047167396/1201844059827155/?type=2&theater

Sonhando Em Voz Alta

Capítulo 3


"E tenho uma música para quando estou triste também, queres ouvir?", perguntou uma rapariga bonita, de olhos grandes e verdes, com o cabelo comprido segurando uma viola. Eu conhecia esta rapariga, é a Marta da minha turma! Mas... como é que eu fui ali parar? Esforcei-me para tentar lembrar-me de onde tinha estado antes de ali estar, e olhei ao meu redor. Estávamos na biblioteca da escola, mas não estava mais ninguém connosco. Eu continuava sem me lembrar, andava às voltas dentro da minha cabeça como um hamster na sua rodinha de exercício, e ainda assim nem sinal de uma memória ou imagem que me indicasse onde tinha estado antes de chegar até à biblioteca, e se a Marta já lá estava ou se chegou entretanto.
"Então, não queres ouvir? Pareces-me triste, acho que te ia fazer bem!", disse a Marta ao ver-me ali especado a olhar para todo o lado. Só me faltava essa agora, fazer figura de parvo em frente à Marta, logo em frente à Marta! Tentei recompor-me e agir com naturalidade, e respondi:
"Não estou triste... mas podes tocar essa música, agora estou curioso". Ela sentou-se na cadeira normalmente ocupada pela funcionária da biblioteca, e começou a dedilhar na viola. Uns segundos mais tarde, e uns acordes depois juntou a voz e a letra da música. Claro que não conseguia ver que cara tinha naquele momento, mas sei que estaria com a boca aberta à disposição de qualquer mosca mais atrevida, e que ela só se mexeu quando me juntei à voz da Marta para cantar o refrão:

Quando o dia correr mal
Lembra-te de sorrir
E nem que seja a dormir
Tudo pode mudar


"E nem que seja a dormir, tudo pode mudar"... foi como se tivesse despertado por dentro, estava outra vez a sonhar! Mais uma vez aquilo era só um sonho, nada real, novamente. Pensei que fosse acordar, que voltasse ao meu quarto na minha cama, mas não. Sabia que se quisesse era isso que aconteceria, mas porque quereria isso? Aqui estava eu com a Marta a ouvi-la cantar, tinha estado em Old Trafford a deixar o meu pai com um sorriso rasgado, para quê que iria voltar à tão valorizada realidade agora? Aqui tudo acontecia como queria, era tudo bom, sentia-me feliz, não tinha razões para voltar. Só tinha que prolongar aquele sonho, e evitar que algo me acordasse, tinha só que me concentrar em tudo o que me estava a acontecer, e talvez conseguisse fazer desta a minha nova realidade! Se calhar é isso que todos devemos fazer, se calhar é isso que significa "ser feliz". Estava determinado em seguir à risca o meu novo plano. Olhei para a Marta e sorri, mas nos olhos dela ja não via a mesma leveza de uns minutos atrás, agora no seu olhar estava marcada uma desconfiança, como se percebesse que algo se passava, como se tal como eu se tivesse apercebido de que isto era apenas um sonho, mas tivesse uma reação diferente.
"Não te preocupes, está tudo bem, estamos seguros aqui, prometo", disse-lhe, na esperança de que aquele olhar mudasse, afinal de contas o sonho era meu, era suposto as coisas serem segundo o que eu desejo.
"Pedro, quanto mais tempo ficares aqui mais tempo irá demorar até que prefiras estar acordado", respondeu, deixando-me baralhado.
O que se seguiu foi demasiado confuso para tentar explicar ao pormenor, tornou-se uma espécie de montagem de imagens, talvez a junção de outros sonhos, pedaços do que sonhei e que assim separados não tem grande significado."Tenho que ir... até já Pedro", acrescentou.
"Até já", respondi, ainda confuso.

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